Piedade Coutinho: A Insulana que fez história na natação
Encerramos ontem mais uma edição dos jogos olímpicos, onde as nossas mulheres brasileiras bateram recordes e conquistaram o melhor resultado de medalhas obtidas pela força feminina em toda a história olímpica.
Aproveitando todo esse clima de conquistas femininas nos jogos de Tóquio, devemos ressaltar que foi na Ilha do Governador, no ano de 1920, que nasceu um dos maiores nomes da história da natação brasileira: a super campeã Piedade Coutinho. Ela participou de três olimpíadas e está no hall da fama da natação e é reconhecida como pioneira na inserção das mulheres brasileiras no esporte de competição.
Nossa conterrânea cresceu à beira-mar e desde a infância já demonstrava a sua grande paixão pelo esporte. Naquela época, a natação nacional era vinculada a Marinha e diversos campeões brasileiros eram marinheiros. Observando todo o talento de Piedade, o comandante Irineu Ramos Gomes, com a autorização da família, levou a jovem para treinar no Clube de Regatas Guanabara, que havia construído a primeira piscina de 50 metros do Rio em 1934 e logo na competição inaugural daquela piscina, Piedade venceu a sua prova, disputando com diversos nadadores da Liga Carioca de Natação, ganhando da imprensa o apelido de “garota prodígio”. O sucesso de Piedade foi meteórico e em 1936, nos Jogos Olímpicos de Berlim, ela foi a primeira nadadora brasileira a obter uma classificação olímpica (5º lugar).
Os Jogos Olímpicos de 1940 e 1944 não foram realizados por causa da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), quando ocorreu o ápice de sua carreira. Nos Jogos de Londres, em 1948, ela voltou a competir e obteve o quinto lugar nos 400 metros nado livre, mesma classificação obtida por ela nesta prova em 1936. A proeza tornou-a novamente finalista olímpica 12 anos depois. Em 1952 ela voltou a integrar a nossa equipe olímpica, em Helsinque, capital da Finlândia, mas não obteve classificação para a final. Piedade foi campeã brasileira e sul-americana diversas vezes e bateu vários recordes como a maior especialista em nado livre do país.
Coutinho teria encerrado sua carreira em competições para se casar e teve dois filhos, no entanto, em uma decisão inusitada, incomum naquela época, voltou à natação em 1943. A própria Piedade declararia, anos depois: “Existiam muitos tabus naquela época em que a mulher não podia nadar, que a mulher era uma dona de casa, casada com filhos, não podia fazer esportes, era feio. E eu acho que eu dei um exemplo à mulher brasileira, que nós podemos fazer isso e devemos, não só para darmos exemplo aos nossos filhos e a juventude, mas para o nosso corpo e nossa saúde também.”
Após deixar as piscinas, foi diretora de natação do Botafogo e também iniciou um trabalho de recuperação de deficientes físicos. Interesse surgido durante a Olimpíada de 1936, quando, em Berlim, visitou um hospital que através da natação promovia a recuperação de crianças deficientes. No final da década de 50, fez campanha para a construção do Lar de Recuperação da Paralisia Infantil, onde desenvolveu atividades aquáticas, dando continuidade à esse trabalho em Portugal, onde residiu por oito anos, e também em Brasília.
Em 1983, retornou ao Clube de Regatas Guanabara, onde deu seus primeiros passos na natação competitiva, para praticar diariamente, ministrar aulas de aprendizagem aos amigos e se dedicar ao seu hobby favorito, a pintura. Piedade Coutinho, que nadou no Guababara, Vasco, Flamengo, Botago e no Fluminense, faleceu em 14 de outubro de 1997, aos 77 anos, mas a longevidade de suas conquistas tão impressionantes, devem ser eternamente motivo de orgulho para todos os brasileiros e insulanos.
O seu quinto lugar de 1936 se manteve como a melhor colocação olímpica feminina do Brasil até 1964, quando Aida dos Santos foi quarta colocada no salto em altura. Em Jogos Pan-Americanos, uma mulher brasileira voltou a conquistar uma medalha individual na natação somente em 1971, com Lucy Burle nos 100m borboleta e em Olimpíadas, o Brasil teve que esperar 56 anos para voltar a ter uma finalista, com Joanna Maranhão nos 400m medley em 2004.
Mesmo sido muito atrapalhada pelo cancelamento de dois Jogos Olímpicos, Piedade é a nadadora brasileira com mais participações olímpicas, empatando apenas com Joana Maranhão e Fabiola Molina.
Que a história dessa guerreira possa inspirar a nova geração, sobretudo as mulheres a não desistirem dos seus objetivos e que os nossos atletas sejam mais valorizados, tenham maior apoio dos governos, patrocínios das empresas e o reconhecimento da população.